7 de março de 2011

Chamados de modo irresistível

Pois aqueles que de antemão conheceu, também os predestinou para serem conformes à imagem de seu Filho, a fim de que ele seja o primogênito entre muitos irmãos. E aos que predestinou, também chamou; aos que chamou, também justificou; aos que justificou, também glorificou. Rm 8:29-30
Os que foram conhecidos de antemão e predestinados por Deus na eternidade, são chamados na história. Observe que os chamados são todos e somente aqueles que foram anteriormente conhecidos e predestinados. Isto aponta para um sentido da palavra chamados que vai além de mero convite.

De fato, nas epístolas, sempre que a palavra chamados ocorre é no sentido de uma chamada interior, poderosa, irresistível. Chamar nessa passagem deriva de kaleõ, que nas epístolas sempre denota "convocar, intimar", não apenas convidar externamente, mas tem o sentido de "chamar interna, eficiente e salvadoramente" (JFB). "O amor de Deus, que reina no coração daqueles que outrora foram inimigos, prova que eles foram chamados segundo o Seu propósito" (Mathew Henry).

Consideremos alguns aspectos desse chamado. Em primeiro lugar, Deus é quem nos chama. Não se trata de um mero convite humano, recheado de chantagem emocional, mas da convocação de um soberano: "Fiel é Deus, o qual os chamou à comunhão com seu Filho Jesus Cristo, nosso Senhor" (1Co 1:9). Paulo foi "chamado para ser apóstolo de Cristo Jesus pela vontade de Deus" (1Co 1:1) e por isso reconhecia que "Deus me separou desde o ventre materno e me chamou por sua graça" (Gl 1:15). No chamado de Deus importa a vontade de Deus, e não do homem, pois todos os que o foram, "foram chamados de acordo com o seu propósito" (Rm 8:28).

Por ser um "chamado celestial" (Hb 3:1) e não terreno, é um chamado poderoso. Deus os "chamou para isso por meio de nosso evangelho" (2Ts 2:14), que "é o poder de Deus para a salvação de todo aquele que crê" (Rm 1:16). "Para os que foram chamados, tanto judeus como gregos, Cristo é o poder de Deus e a sabedoria de Deus" (1Co 1:24). Experimentaram que não fosse uma chamada poderosa, ainda estariam chafurdando em seus pecados. Por isso se alegram em "anunciar as grandezas daquele que os chamou das trevas para a sua maravilhosa luz" (1Pe 2:9).

E é para se alegrar mesmo, especialmente quando consideramos o propósito para o qual fomos chamados. Para esta vida, o chamado implica renúncia e sofrimento. Os eleitos são "chamados para serem santos, juntamente com todos os que, em toda parte, invocam o nome de nosso Senhor Jesus Cristo, Senhor deles e nosso" (1Co 1:2) e mesmo quando são afrontados lhes é ordenado que "não retribuam mal com mal nem insulto com insulto; pelo contrário, bendigam; pois para isso vocês foram chamados" (1Pe 3:9).

Mas a chamada não se resume a esta vida. "Cristo é o mediador de uma nova aliança para que os que são chamados recebam a promessa da herança eterna" (Hb 9:15). Paulo aconselhou Timóteo dizendo "tome posse da vida eterna, para a qual você foi chamado" (1Tm 6:10), pois de fato o Senhor nos "chamou para a sua glória eterna em Cristo Jesus" (1Pe 5:10). Para isso nosso Pai nos dá "todas as coisas de que necessitamos para a vida e para a piedade, por meio do pleno conhecimento daquele que nos chamou para a sua própria glória e virtude" (2Pe 1:3), "a fim de tomarem posse da glória de nosso Senhor Jesus Cristo" (2Ts 2:14).
Essa chamada é feita pelo "Deus de toda a graça" (1Pe 5:10), logo, é uma chamada graciosa, não baseada em características e capacidades humanas. Paulo se refere "a nós, a quem também chamou, não apenas dentre os judeus, mas também dentre os gentios" (Rm 9:24). Os judeus tinham vantagem sobre os gentios? "Muita, em todos os sentidos! Principalmente porque aos judeus foram confiadas as palavras de Deus" (Rm 3:2). No entanto, isso não contou na chamada divina. Inteligência, poder, nobreza, tornam alguém mais habilitado a responder ao chamado? "Irmãos, pensem no que vocês eram quando foram chamados. Poucos eram sábios segundo os padrões humanos; poucos eram poderosos; poucos eram de nobre nascimento" (1Co 1:26). Se dependesse do homem, era de se esperar que alguns estivessem melhor qualificados que outros. Mas não, Deus "nos salvou e nos chamou com uma santa vocação, não em virtude das nossas obras, mas por causa da sua própria determinação e graça" (2Tm 1:9).
Isso não significa que o homem não tem participação ativa na resposta ao chamado divino? De jeito nenhum. O homem responde com fé e arrependimento ao chamado interno do Espírito Santo. Mas a fé e o arrependimento com os quais respondem são dons de Deus, embora seu exercício seja do homem. Contudo, o fato de que ninguém que não seja chamado interiormente responda com fé, aliado ao fato de que somente os que são chamados sobrenaturalmente pelo Espírito o fazem, demonstra que o fator decisivo na chamada eficaz é a vontade de Deus e não o arbítrio do homem.

Soli Deo Gloria

Clóvis Gonçalves é blogueiro do Cinco Solas e escreve no 5 Calvinistas às segundas-feiras.

Um comentário:

  1. Fé e arrependimento como dons de Deus.
    Acredito que aí esteja a origem de tantos mal-entendidos quando aos cinco pontos do calvinismo.
    O senso comum - sempre se volta a ele - é que eu creio se eu me convencer de que isso é a verdade e, convencido, eu quiser fazê-lo. E sempre fica para trás o fato de que eu não me convenço nunca e, portanto, nunca quererei crer, porque a minha natureza caída me impede disso.
    "Porque pela graça sois salvos, por meio da fé; e isso não vem de vós; é dom de Deus. Não vem das obras, para que ninguém se glorie" (Ef 2:8-9).
    E não é à glorificação do único que deve ser exaltado que nos leva esse entendimento? Mas como é difícil ao homem despir-se do último átimo de autoglorificação que ainda lhe restaria - ter fé a partir de si mesmo! Não seria isso que leva nossos irmãos de outras confissões cristãs a negar essa doutrina?
    A fé não vem de nós, mas é dom de Deus, e ao Senhor Deus seja toda a glória por isso!

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